A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que, nas comarcas que não possuem vara especializada em violência doméstica, o juízo cível tem competência para aplicar medidas protetivas estabelecidas na Lei 11.340/2006, conhecida como Lei Maria da Penha. De acordo com o colegiado, essa concessão de medidas protetivas pelo juízo cível desempenha um papel importante na prevenção rápida e uniforme da violência doméstica e familiar contra a mulher.
O caso envolveu uma mulher que alegou ter sido vítima de agressões físicas e morais por parte de seu marido. Ela ingressou com uma ação de divórcio em uma vara cível e solicitou a adoção de medidas protetivas. A juíza responsável deferiu uma liminar que impôs diversas medidas protetivas contra o marido, incluindo a proibição de se aproximar da autora da ação e de sua residência.
Posteriormente, outro magistrado assumiu a vara cível e revogou a decisão anterior, argumentando que o juízo cível não tinha competência para aplicar medidas protetivas da Lei Maria da Penha. No entanto, o Tribunal de Justiça da Bahia (TJBA) restabeleceu a medida protetiva de afastamento do lar, alegando que a falta de ação jurisdicional poderia causar danos irreversíveis à mulher.
No recurso ao STJ, o marido alegou que a decisão do TJBA violou o artigo 33 da Lei 11.340/2006, que estabelece que as medidas protetivas devem ser solicitadas à vara criminal da comarca e não à vara cível, que seria incompetente para decidir sobre o assunto.
O ministro Marco Aurélio Bellizze, relator do caso, observou que a Lei Maria da Penha foi criada para cumprir o artigo 226, parágrafo 8º, da Constituição Federal, que prevê a coibição da violência doméstica e familiar contra a mulher. Essa lei estabeleceu a instalação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar, que têm competência híbrida (criminal e cível) de acordo com o artigo 14 da lei.
Bellizze explicou que, enquanto não houver um juizado especializado em violência doméstica na comarca e não for necessário recorrer ao juízo criminal, como no caso da ação de divórcio em questão, o juízo cível é competente para processar e julgar o pedido de medidas protetivas. Isso permite que o juízo cível adote providências compatíveis com a jurisdição cível, com o objetivo de proteger o bem jurídico tutelado pela lei, ou seja, prevenir ou interromper a violência doméstica e familiar contra a mulher de forma rápida e uniforme.
O ministro enfatizou que a interpretação da Lei Maria da Penha proposta no recurso levaria a vítima de violência doméstica a ingressar com uma ação de divórcio no juízo cível e, ao mesmo tempo, buscar medidas cautelares perante o juízo criminal, devido à falta de um juizado especializado na comarca. Essa interpretação estaria em desacordo com o objetivo da lei, que é proteger a mulher, e poderia resultar em decisões contraditórias em relação ao reconhecimento da violência doméstica, o que não seria aceitável.