Por Rony Torres
I – O começo da história do “prefeito itinerante”.
III – Joãozinho segue na luta para poder ser candidato mais uma vez.
I – O começo da história do “prefeito itinerante”
João Felix de Andrade Filho, ou Joãozinho Felix para os mais íntimos e eleitores assíduos, é o que podemos chamar de “político profissional”. Envolvido pessoalmente nos meandros da política, tomou um gosto peculiar pela gestão pública e de lá nunca mais quis sair. Mesmo a justiça tentando tirá-lo do cargo em mais de uma oportunidade, ele permaneceu resiliente na sua missão. Foi vereador em 1992, prefeito em 1996, reeleito em 2000, eleito novamente em 2004, reeleito em 2008…. Voltou em 2020 e parece que é o fim de carreira em 2023.
Mas não é essa variabilidade política que importa nesse momento. E sim a sua inquestionável vontade por estar ativamente na gestão administrativa, principalmente no cargo de prefeito.
Em 1996 foi eleito pelo munícipio de Jatobá do Piauí, onde ficou como prefeito até os anos 2000 e foi reeleito para o mesmo cargo (2000-2004).
Contudo, como bem sabemos pela legislação vigente, é impossível um mandatário a chefe do executivo ficar 3 mandatos seguidos na cadeira de prefeito. Então, em 2003, ele “nobremente” renunciou ao cargo de prefeito de Jatobá e foi atrás da cadeira de prefeito de Campo Maior (cujas eleições ocorreriam em 2004).
É uma vontade e um esforço admiráveis por parte de Joãozinho Felix, indubitável o seu interesse pelas eleições e de sempre se manter no cargo de prefeito, independente das intempéries que possam surgir no seu caminho, mesmo quando essas intempéries venham justamente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e Supremo Tribunal Federal (STF).
Não se pode dizer que a primeira turbulência no cargo de prefeito veio “cedo”, já que quando foi “atingido” pela justiça pela primeira vez já estava na vida pública há quase 18 anos e pelo menos 14 deles como prefeito.
Acontece que, quando Joãozinho fez a troca da cadeira da prefeitura de Jatobá pela prefeitura de Campo Maior em 2004 (vencendo as eleições até que com uma margem confortável), o TSE já começava a fiscalizar diversos prefeitos que se perpetuavam no cargo através de prefeituras vizinhas – mantendo o eleitorado fiel e trocando de cadeira quando não podia mais ser reeleito. E esse era o exato caso de Jatobá e Campo Maior.
Em 2008, para a surpresa de 0 pessoas, Joãozinho foi reeleito para a prefeitura de Campo Maior. Contudo, nesse período, entre 2008-2012 (quarto mandato de Joãozinho como prefeito), as cortes superiores proibiram a figura do “prefeito itinerante”, formando jurisprudência para que todos os prefeitos nessas condições deixassem o cargo.
Joãozinho não desistiria de sua cadeira tão fácil, e foi ao STF discutir o tema, que surpreendentemente foi julgado ao seu favor. O STF entendeu que, como o TSE havia mudado sua jurisprudência somente após o período que Joãozinho tinha assumido sua cadeira, a decisão do TSE, de retirada do cargo dos prefeitos “itinerantes”, não o alcançaria e, portanto, sua cadeira estava garantida até 2012 – mas como já era o seu segundo mandato (não poderia concorrer de novo em Campo Maior) e como o TSE acabava de proibir a figura do prefeito itinerante, ele não poderia voltar para a cadeira de Jatobá.
Era o momento de um período sabático. Recuperar as forças para brigar por sua amada cadeira mais na frente.
Férias…
Mas ele não esperava que o novo prefeito, Paulo Martins, fosse processá-lo por improbidade administrativa…
II – Joãozinho enfrenta Paulo Martins num processo que colocaria em xeque a sua vocação de ser prefeito.
Joãozinho Felix, em 2012, já acumulava 16 anos como prefeito municipal (contando Jatobá e Campo Maior) e quase 20 anos como político profissional, se contarmos o seu período exercendo a função de vereador. Assim, sua vitória no STF para não sair do cargo em decorrência da proibição da figura do prefeito itinerante (CLIQUE AQUI PARA SABER MAIS) fechou o seu ciclo com chave de ouro, mesmo que seu opositor político, Paulo Martins (PT) tenha ganhado as eleições para os anos de 2012-2016.
Foi o momento de Joãozinho se afastar brevemente da vida pública (oficialmente) e deixar a administração de Campo Maior nas mãos de outra pessoa. Contudo, o município, já vinha sendo gerido por Joãozinho há quase uma década. As marcas de seu governo estavam em todos os lugares. Dos níveis mais baixos da administração pública até a importante gestão de recursos.
Foi quando o inesperado aconteceu. Já no início da administração do novo prefeito, Paulo Martins, constatou-se supostas irregularidades na prestação de contas e divergências na publicação dos relatórios em diário oficial.
Em defesa do Município de Campo Maior, Paulo Martins disse que Joãozinho não declarou onde aplicou as receitas que tinham como objetivo beneficiar a população. O dinheiro sumiu? Foi aplicado e não declarado? Foi declarado errado? Não se sabe. Veja trecho da petição de Paulo contra Joãozinho:
Logo, Joãozinho teve que sair de suas “férias sabáticas” para se defender das acusações feitas pelo novo prefeito de Campo Maior.
Paulo Martins, não economizou esforços e pediu a condenação de Joãozinho por improbidade administrativa, que, pela lei vigente, encontrava fundamentos razoáveis para o seguimento do processo.
Paulo Martins exigiu da justiça que caso não punisse a suposta desídia de Joãozinho, que pelo menos o obrigasse a apresentar as provas de que o dinheiro foi revertido para o benefício da população. Veja:
Ao final, Paulo Martins alegou que o dano sofrido, somente pelos supostos desvios de verba, foi de cerca de R$ 800.000,00 (oitocentos mil reais) e que a única coisa que Joãozinho deixou para de Campo Maior foi a inscrição do Município no Rol de inadimplentes (o CAUC).
Paulo ainda pediu que os bens de Joãozinho fossem bloqueados pela justiça, com a finalidade de ressarcir os prejuízos sofridos pelo município, evocando o Código de Processo Civil, em seu artigo 591 – afirmando que, uma vez configurado o dano ao patrimônio público, os gestores respondem com todos os seus bens.
O imbróglio jurídico estava montado. Agora em 2023 Joãozinho está com seu mandato cassado pelo Tribunal de Justiça do Piauí. Em um processo extremamente complexo e com movimentos que até os maiores especialistas na academia de direito têm dificuldade de explicar. Um processo que até as próprias partes foram desistindo com o tempo, e entrando novos. Mas toda a confusão se originou aí.
Pois bem.
Joãozinho não perdeu tempo, e prontificou-se em apresentar sua defesa em que acusava o próprio Paulo Martins de falhar com a prestação de contas. Segundo Joãozinho “Agora o pepino era dele” – retirando todo o juridiquês. Mas veja um trecho do que Joãozinho alegou em sua defesa:
João Felix então passou a argumentar que todos os relatórios haviam sido apresentados. Todos na data e no prazo legal (chamando Paulo Martins, juridicamente, de mentiroso). E em um ato de “desespero jurídico”, Joãozinho diz que a ação nem deveria ter sido proposta pois foi apresentada “somente” com o argumento de que os relatórios não haviam sido apresentados, e segundo ele, os relatórios tinham sido apresentados sim – e por isso a ação deveria acabar ali mesmo, mesmo sem se manifestar sobre os quase R$ 800.000,00 que Paulo Martins afirmava terem sumido dos cofres públicos.
Notadamente, a tentativa de Joãozinho não “colou” e o processo seguiu para julgamento.
(Lembrando que aqui estamos fazendo um resumo para que o leitor entenda todo o caso, da cassação do prefeito de Campo Maior, em 2023 de forma didática)
Joãozinho fez um trabalho hercúleo e juntou todas as declarações (em formato resumido) de suas prestações de contas junto ao TCE, resultando em um volume gigantesco de documentos anexados ao processo – e dos quais se precisa de uma habilidade técnica muito grande para se entender a organização com as quais foram juntadas.
O juiz do caso, então, passou a analisar o processo, de acordo com a lei de improbidade administrativa da época. Lembrando que a lei de improbidade administrativa foi atualizada (ainda durante o processo de Joãozinho), o que adicionou mais um grau de complexidade ao caso, já que no direito brasileiro a lei mais recente beneficia o réu.
O juiz do caso, o dr. JULIO CESAR MENEZES GARCEZ entendeu que Joãozinho era inocente.
Um alívio para o ex-prefeito.
Na sentença, o magistrado entende que, Joãozinho, pelo simples fato de ter apresentado as folhas de prestação de contas, desincumbiu-se de todo o dever de demonstrar a destinação das verbas públicas das quais foi acusado de desviar.
E assim, o Homem que gostava de ser prefeito (Joãozinho) se livrava da condenação de improbidade administrativa, que o tornaria inelegível e impediria que fosse realizada uma das suas maiores vocações: SER PREFEITO!
Com a decisão proferida pelo juiz em seu favor, agora era só relaxar e aguardar as próximas eleições para se candidatar.
O problema foi que Joãozinho relaxou demais…
Paulo Martins não só recorreu dessa decisão do dr. Júlio Cesar, como entrou com novos processos por improbidade, e Joãozinho, no seu relaxamento sabático, acabou perdendo o prazo de um dos recursos.
III – Joãozinho segue na luta para poder ser candidato mais uma vez
Como vimos, Joãozinho enfrentou de “peito aberto” o atual prefeito de Campo Maior em 2013 e venceu na justiça de primeiro grau. As alegações de improbidade administrativa lançadas contra ele foram desconsideradas pelo magistrado Júlio Cesar que julgou o caso 100% favorável a Joãozinho, permitindo com que ele pudesse se candidatar ao cargo de prefeito, podendo somar mais tempo à sua quase uma década à frente da prefeitura de Campo Maior.
Assim, o processo foi finalizado, e a advogada de Joãozinho ainda ganhou seus honorários, pagos pelo município de Campo Maior, que perdeu a ação.
Joãozinho estava tranquilo, mais uma vez.
Sua defesa parece que também adotou o “tom de tranquilidade”.
O problema era que Paulo Martins não estava tranquilo e imediatamente recorreu da decisão proferida pelo juiz Júlio Cesar ao passo que entrou com uma nova ação. Dessa vez, Paulo afirmava que Joãozinho fez acordos judiciais para pagar devedores do município no importe de mais de R$ 180.000,00 (cento e oitenta mil reais) sem tomar as devidas medidas administrativas necessárias.
Mas esse era um processo para outro momento (0001970-91.2014.8.18.0026). O foco de Joãozinho, agora, era manter a vitória no tribunal, daquele processo que ele já tinha ganhado na primeira instância. E foi assim que o resiliente prefeito fez, enquanto esse outro processo seguia.
Em seu recurso de apelação, no processo que havia perdido pela decisão do Dr. Júlio Cesar, Paulo Martins alegou que o magistrado sequer havia considerado que o Joãozinho tinha apresentado diversos relatórios de forma atrasada. E que essa apresentação atrasada é tão passível de penalidades quanto a não apresentação, pois causam prejuízos para o município.
O então prefeito estava determinado, e argumentou que a apresentação atrasada dos relatórios de contas junto ao Tribunal era igualmente passível de aplicação do crime de improbidade. Paulo estava determinado a não permitir que Joãozinho retornasse para qualquer cadeira de prefeito. Nem em Campo Maior e nem em lugar nenhum. Queria uma condenação por improbidade, e logo uma imediata inelegibilidade.
Veja trecho do recurso que pede a condenação de Joãozinho por improbidade:
Paulo Martins, então passou a apelar para “a parte emocional do processo”. Começou a alegar que a gestão de Joãozinho causou danos morais à imagem do Município de Campo Maior pois foi inscrito no rol de inadimplentes, causando, além de tudo, prejuízo à honra subjetiva pois passou a ser visto como uma entidade que não cumpre com seus compromissos.
Como visto, a determinação de Paulo e seus assessores era invejável.
Joãozinho, provavelmente, continuava tranquilo. Já tinha ganho em primeira instância.
Aquela apelação de Paulo Martins não trazia nada de ameaçador, não poderia inovar (regras do direito) e os argumentos de fato eram “apelativos”.
Fez o seu recurso com calma. E apresentou suas contrarrazões em seu próprio tempo. Enquanto isso, o outro processo que o acusava de causar um prejuízo de R$180mil seguia.
Acontece que o tempo que Joãozinho reservou para si e para apresentar o seu recurso, não era o mesmo tempo estabelecido pela justiça. E o outro processo seguia em paralelo. (Vamos manter em mente esse “outro processo em paralelo).
E daí em diante, foi só “ladeira abaixo” …
Somente para correlacionar os fatos, nas contrarrazões de Joãozinho ele afirmava que como Paulo Martins não conseguiu comprovar nenhuma das acusações, o processo sequer deveria seguir para julgamento.
E apela para o argumento de que os atrasos também foram culpa de Paulo Martins, pois Joãozinho também já tinha sido afastado por um tempo de sua cadeira de prefeito, e quem se sentou nela foi o próprio Paulo (que em tese seria igualmente responsável por prestar contas). Esse caso ocorreu durante os processos de Joãozinho nos casos de prefeitos itinerantes (VEJA AQUI)
Enquanto isso, no outro processo (dos R$180mil) Joãozinho se defende dizendo que a inicial apresentada por Paulo era inválida (inépcia) por questões jurídicas e que todas as acusações eram feitas com base somente em suposições.
Joãozinho segue uma linha de defesa que foca em encontrar nulidades processuais, para finalizar o processo. E acaba pecando no requisito de apresentação de provas.
Lembre-se que naquele processo que ele ganhou em primeira instância, ele apresentou uma ampla gama de documentos que comprovavam a sua prestação de contas. Já nesse processo, ele estava confiante e apresentou defesa meramente baseada em inépcias.
Aproveitou ainda para acusar Paulo de só querer pagar as dívidas de sua gestão, sem se preocupar com o pagamento das dívidas da gestão anterior.
E enquanto isso o outro processo, que o acusava de falhas na prestação de contas, subia para o julgamento no tribunal.
Evidentemente, Joãozinho não estava preocupado com esse segundo processo – e focou todas as suas forças e assessorias em finalizar o que subia para julgamento.
E mais uma vez, o destino do Homem que gostava de ser prefeito estava em xeque – mas, diferentemente das outras ocasiões, essa perda de prazo, se notada, poderia acarretar consequências gravíssimas para o seu destino como futuro candidato.
IV – Entre vitórias e derrotas processuais, o sonho de ser prefeito nunca morre, que venham as eleições de 2019 – A cadeira já tem o nome “Joãozinho”
A confusão jurídica foi montada durante o início do governo de Paulo Martins, lá em meados de 2012. Ficou mais de quatro anos em movimento. Paulo Martins saiu da prefeitura de Campo Maior, e o novo escolhido para assumir a cadeira foi o professor Ribinha, que por sua vez também herdava o dever de continuar processando o Joãozinho, pois era o responsável pelo município de Campo Maior.
Podemos dizer que o empenho do novo prefeito, Ribinha, em condenar Joãozinho pelo crime de improbidade administrativa, não foi tão dedicado como fora Paulo Martins.
Quando Joãozinho protocolou sua defesa no processo que o acusava de causar prejuízo de cerca de R$180mil em acordos judiciais ao município de Campo Maior, faltavam apenas alguns meses para Ribinha ganhar as eleições municipais.
Nem de longe, o futuro prefeito, Ribinha, se interessou pelos processos ou pelos rombos que Paulo Martins alegava terem sido deixados por Joãozinho.
Mas o processo foi dado entrada pelo município, e como representante máximo, ele não podia deixar de dar andamento às acusações em interesse do município de Campo Maior.
Acontece que o processo que o acusava de não prestar contas corretamente passou por outras tantas movimentações jurídicas estranhas, e não sofreu grandes avanços durante o período Ribinha, vindo a ter uma decisão do colegiado somente em 2022.
Ou seja, esse processo, ainda se estendeu por 10 anos, sem que nada de definitivo tivesse sido apresentado nele, dando tempo, inclusive, de Joãozinho se candidatar mais uma vez.
Logo, Paulo Martins entrou e saiu da prefeitura – sem finalização do processo.
Ribinha, entrou e saiu da prefeitura – sem finalização do processo.
Em 2020 o homem que gostava de ser prefeito retornou “para o seu lugar de direito” (a cadeira de Campo Maior) vencendo as eleições de 2019 e retornando para um novo mandato como autoridade máxima de Campo Maior.
Contudo, aquele outro processo, que o acusava de causar prejuízos de R$180mil, ainda seguia o seu rumo.
Mas como agora o prefeito era o próprio acusado de improbidade, não poderia ser ele o responsável por dar seguimento à causa. Então o Ministério Público entra como titular de todas as acusações contra o Joãozinho.
E dessa vez, existe um empenho formidável do órgão ministerial em cumprir suas funções. E em uma primeira manifestação, em 2021, feita pelo Procurador de Justiça José Ribamar da Costa, entende-se que Joãozinho é inocente no primeiro processo, e a decisão de primeira instância merecia ser mantida.
Veja a manifestação do Ministério Público:
Uma derrota para Paulo Martins que iniciou todo o esforço.
E para a surpresa de alguns que acompanhavam o processo mais de perto, em 2022, o tribunal, através da Segunda Câmara de Direito Público, manteve a decisão do juiz de primeira instância desconsiderando a acusação de improbidade administrativa de Joãozinho.
Um novo motivo de tranquilidade para João Felix. Além de uma vitória no tribunal, já estava há dois anos na cadeira que lhe era tão familiar.
Relaxou…. mas relaxou demais.
Aquele outro processo seguia.
E nele o Ministério Público não viu a inocência de Joãozinho.
Naquele processo, na última manifestação feita por Paulo Martins, antes de Ribinha assumir em 2016, o Prefeito afirmava que Joãozinho saiu fazendo acordos judiciais de forma indiscriminada, sem preocupar-se como o município poderia pagar, deixando, assim, diversas dívidas para Campo Maior e um cofre zerado para saldá-las.
A sentença desse processo veio em 2017, no meio da gestão de Ribinha, e nos preparativos para a o fim das “férias” de Joãozinho e o planejamento de sua pré-campanha de 2019.
A sentença foi dura. E não só condenava Joãozinho na restituição de valores, mas também no crime de improbidade administrativa, suspendendo todos os seus direitos políticos e a proibição de contratar com o poder público.
Ou seja, Joãozinho, em tese, não poderia concorrer às eleições de 2019 e retornar para sua amada cadeira em 2020.
Veja trecho da sentença que o condenou:
Para qualquer ser humano comum, esse seria um balde de água fria que faria qualquer um desistir de suas pretensões. Mas não para o Homem que gostava de ser prefeito.
Para Joãozinho, não era nem questão de ver a luz no fim do túnel, ele já estava lá na Luz.
A campanha de 2019 já “estava no papo”.
Provavelmente ele pensava que essa decisão seria revertida, como a anterior foi….
Agora era só relaxar… Mais uma vez…
V – Joãozinho é condenado por improbidade, mas a sua vontade de ficar no cargo foi maior que a vontade da justiça de o tirar do cargo
Joãozinho venceu um processo que durou mais de 10 anos, acusando-o de improbidade. Venceu em primeira instância, venceu em segunda instância, e quando o Ministério público assumiu, também foi favorável ao seu pleito, entendendo que ele não poderia ser acusado de improbidade por apresentar as prestações de conta de forma atrasada. (Veja Aqui)
De fato, um processo que dura mais de uma década tira as forças de qualquer um. E Joãozinho estava focado nas eleições de 2019. Sua cadeira de prefeito era o foco.
Mesmo tendo um novo processo, que dessa vez o condenava em atos de improbidade e impedia que ele participasse da campanha de 2019, a decisão judicial era “um mero detalhe” … Não ia ser a justiça que o “impediria”. Ele já havia ganhado em um processo e ganharia nesse novamente.
Contudo… Adveio um pequeno probleminha de ordem técnica: a assessoria de Joãozinho esqueceu-se de recorrer.
Na academia, tinha um professor de processo civil que quase todos os dias recitava o “mantra do advogado” – “Quem tem prazo não tem pressa”.
A defesa, talvez, recitou demais esse mantra.
Para os menos entendidos no direito, quando não se recorre de uma decisão, significa dizer que a parte está aceitando a sentença da forma como ela está.
Ou seja: Joãozinho “aceitava” a condenação em restituir os valores de mais de 180mil aos cofres públicos, e aceitava o crime de improbidade administrativa que retirava os seus direitos políticos.
A condenação de Joãozinho foi publicada em 19 de julho de 2018 – ou seja, um ano antes das eleições de 2019 – e a data final para apresentação da apelação seria 09 de agosto de 2018.
A defesa ainda cuidou em protocolar embargos de declaração – um tipo de recurso que visa pedir a manifestação do juiz sobre algum ponto do processo que não foi analisado.
A defesa só protocolou a apelação em 24 de agosto de 2018.
Notaram? O prazo para a apelação expirou, pois deveria ter sido realizada no máximo até o dia 09 e foi protocolada no dia 24.
Será se Joãozinho ainda estava tranquilo? (não sabemos, mas sua pré-campanha seguia a todo vapor)
O juiz desse processo foi o dr. Anderson Brito, que cuidou em negar os pedidos feitos nos embargos de declaração. Dessa vez, o Magistrado pediu o parecer técnico do MP (como manda a lei) e, diferentemente do processo anterior, o Ministério público entendeu que dessa vez, de fato, Joãozinho merecia ser condenado por atos de improbidade administrativa.
Observem que nem o próprio magistrado, ou o Ministério Público, se atentaram para a tempestividade do recurso. E deram seguimento ao processo, como se nada tivesse acontecido. Isso tudo, ainda durante o Governo Ribinha.
Quando em 2020 – já sob a gestão de Joãozinho, em um último ato, Ribinha protocola um pedido de “chamamento do feito a ordem” atentando para a perda do prazo recursal por parte da defesa de Joãozinho.
Mais uma vez, faremos uma breve pausa para explicar o “juridiquês” por trás de um ato “intempestivo” ou fora do prazo.
Esse tipo de alegação – de intempestividade – pode ser feito a qualquer momento do processo, pois é passível de nulidade. Por isso, a alegação de intempestividade, mesmo feita quase dois anos após a publicação da sentença, foi aceita e confirmada.
Logo, se o juiz considerar a intempestividade do recurso de apelação, ele não precisaria sequer analisar os argumentos do recurso, e já deveria fazer cumprir a sentença.
E foi, mais ou menos o que aconteceu.
Acontece que Joãozinho se prontificou em retirar sua atual assessoria, e contratou alguns dos mais competentes advogados que se tem em Teresina.
E eles fizeram alguns “milagres jurídicos” no caso de Joãozinho, permitindo com que ele mantivesse a sua “destinação vocacional” de permanecer sentadinho na cadeira de prefeito.
Observem que:
1 – Joãozinho foi condenado por improbidade administrativa, antes mesmo das eleições que o elegeram.
2 – Assumiu o cargo, com uma condenação de improbidade administrativa.
3 – Permaneceu seu mandato quase completo com uma condenação por improbidade administrativa.
O leitor mais atento perguntaria: mas como? Se não cabiam mais recursos, se a sentença já devia ser aplicada pois ele perdeu o prazo.
Como Joãozinho conseguiu se manter no cargo?
Continua no Capítulo Final
VI – Dentre manobras jurídicas e recursos duvidosos a história do homem que gostava de ser prefeito chega ao seu ato final
Joãozinho estava acuado no seu cargo, mas agindo como se nada estivesse acontecendo. Assumiu sua cadeira em 2020, dispensou os advogados que perderam prazo. Contratou novos advogados, “melhores e maiores”, e provavelmente mais caros, e seguiu seu mandato… Não tão relaxado, pois a sombra desse processo agora era enorme e colocava em xeque a permanência de Joãozinho na cadeira de prefeito.
Será se esse ato representa o fim da sua vocação? Será se ele não conseguirá ficar duas décadas como gestor municipal?
Para esses mistérios, ainda não temos resposta.
Nesse momento, nos proporemos a analisar e tentar explicar o que aconteceu no processo depois da condenação de Joãozinho, e como ele ficou no cargo por tanto tempo mesmo após ter perdido os direitos políticos.
Lembrando que, em entrevistas, até advogados que participaram do processo no passado sentem dificuldade em entender os malabarismos jurídicos feitos por Joãozinho e sua nova defesa. Logo, nossa tarefa em tentar simplificar esse processo é mais do que hercúlea.
Quando todos começaram a ficar mais atentos ao que estava acontecendo nessa ação, uma série de movimentações estranhas começou a acontecer simultaneamente no processo.
Juízes se declararam suspeitos.
Advogados começaram a substabelecer “loucamente” um para o outro.
Argumentos de recursos e tempestividade sem “pé nem cabeça”.
“Embargos de declaração nos embargos de declaração no agravo de instrumento”.
De fato, é inegável a competência jurídica dos novos advogados de Joãozinho.
A primeira estratégia foi apelar ao tribunal pedindo a reconsideração da questão do prazo – o que de pronto era um argumento muito fraco do ponto de vista jurídico.
Depois, houve relatos de uma série de despachos a fim de evitar o julgamento do agravo de instrumento (que confirmaria a condenação de Joãozinho) por meio de influência no meio jurídico, até que conseguiram tardar o processo por cerca de um ano.
Já em 2023, às vésperas do julgamento, a defesa utilizou sua última cartada. Como o Direito comum já não estava mais ao seu lado e a intempestividade iria ser declarada e confirmada pelo tribunal, os advogados apelaram para o “direito do advogado”.
Resumindo: o advogado tem uma série de prerrogativas, garantidas por lei, ao assumir um processo. Dentre elas, o direito de ter um tempo razoável para estudar o processo antes do julgamento. Assim, caso um advogado assuma o processo muito perto da data fatal, a justiça deve remarcar o julgamento para que o patrono tenha tempo suficiente de garantir a defesa do seu cliente. A violação desse princípio gera nulidade.
E foi exatamente isso que os advogados de Joãozinho fizeram.
Às vésperas do julgamento (e aqui não se faz juízo de valor do motivo) os advogados que patrocinavam a causa de Joãozinho abandonaram o processo, e o novo que assumia pedia que o julgamento fosse adiado.
“Não colou”.
O juiz de plantão, negou o pedido, e seguiu com o julgamento. Confirmando a condenação de Joãozinho em improbidade administrativa.
Mas em 2023, faltando pouco mais de um ano para fechar o seu mandato com chave de … “alguma coisa” … Joãozinho ainda não desistiria e conseguiu arcar do desembargador responsável pelo processo uma reconsideração.
Provavelmente a defesa esperava ganhar mais algumas semanas com esse movimento… Ganhou pouco mais de um dia.
O Tribunal corrigiu o ato, e no dia seguinte já estava julgando o caso.
Em 14 de setembro de 2023, a decisão foi publicada no diário oficial para que a justiça de Campo Maior cumpra as determinações legais.
É o fim de um sonho?
Não se sabe.
O rapaz, o homem e hoje: O idoso que gostava de ser prefeito, vê a justiça colocando uma barreira entre sua cadeira e sua vontade política.
É, literalmente, o fim de uma era (algumas décadas) de administração pública por parte de Joãozinho.
Joãozinho foi condenado à suspensão de seus direitos políticos pelo prazo de 05 anos.
Joãozinho foi condenado ao pagamento de multa de 20 vezes à sua remuneração na época.
Joãozinho foi proibido de fazer qualquer negócio com a administração pública por 03 anos.
Joãozinho foi condenado ao pagamento de honorários no importe de 10%
Joãozinho pode recorrer de todas essas condenações, mas nenhuma tem efeito suspensivo. Ou seja, nenhuma tem a capacidade de permitir que ele permaneça no cargo ou concorra a uma reeleição – a não ser que sua nova defesa consiga em tempo recorde reverter tudo nos tribunais superiores (o que é muito improvável).
Os futuros recursos que devem ser protocolados em favor de Joãozinho, provavelmente terão o condão de somente discutir a questão de valores, porcentagens e reponsabilidade. Os recursos capazes de reverter a condenação em improbidade geralmente não são rápidos e a perda de prazo no recurso de apelação é o martelo no caixão que enterra a permanência de Joãozinho no serviço público.
E esse é o fim da história pública do “homem que gostava de ser prefeito”.