A pedido da Defensoria Pública de Minas Gerais, a Ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu uma ordem de reintegração de posse em favor do Município de Belo Horizonte, que envolvia propriedades urbanas localizadas no bairro Havaí. A liminar foi concedida pela relatora na Reclamação (RCL) 67284.
A relatora também solicitou informações ao Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJ-MG) para entender por que o caso não foi classificado como um conflito fundiário coletivo envolvendo uma população em estado de vulnerabilidade social.
Em uma análise preliminar do caso, a ministra considerou que o caso está abrangido pelo regime de transição estabelecido pelo STF no julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 828. No contexto dessa ação, a Corte determinou que os tribunais estabeleçam comissões de conflitos fundiários, que devem realizar inspeções judiciais e audiências de mediação, como etapa prévia e necessária às ordens de desocupação coletiva. Em caso de remoções de pessoas vulneráveis, deve ser garantido o encaminhamento das pessoas a abrigos públicos, ou adotada outra medida que garanta o direito à moradia, sem a separação dos membros de uma mesma família.
Em agosto do ano passado, o conflito em questão foi encaminhado à Comissão de Conflitos Fundiários do TJ-MG pelo juízo de primeira instância (1ª Vara da Fazenda Pública de Belo Horizonte), mas, em fevereiro deste ano, o presidente do TJ-MG não admitiu a tramitação do processo na comissão, por entender que não se tratava de um conflito fundiário coletivo que exigisse a adoção das medidas impostas na ADPF 828. A reclamação ao STF é contra essa decisão.
Para a Defensoria Pública, não há dúvidas quanto à caracterização de um conflito fundiário coletivo entre as partes, tendo em vista que houve várias tentativas de cumprimento de mandados de reintegração de posse, bem como de negociação dos prazos para cumprimento dos mandados. Ainda segundo a Defensoria, trata-se de uma ocupação coletiva de uma propriedade utilizada como moradia por pessoas vulneráveis e em situação de hipossuficiência social e econômica, anterior a 20/03/2020.
Em sua decisão, a Ministra Cármen Lúcia afirmou que todos os elementos indicam a existência de um conflito fundiário coletivo envolvendo uma população em estado de vulnerabilidade social, devidamente assistida pela Defensoria Pública estadual.
Além disso, segundo observou a relatora, há indicação de que, em 2018, houve uma reunião sobre o planejamento operacional das ações necessárias ao cumprimento da reintegração de posse, que contou com a participação de representantes da Subsecretaria de Fiscalização de Belo Horizonte, da Guarda Municipal, da Secretaria Municipal de Assistência Social, Segurança Alimentar e Cidadania e do Tribunal de Justiça mineiro.
A relatora verificou, ainda, que a ocupação da área ocorreu há mais de nove anos, antes, portanto, do início da pandemia de Covid-19, o que demonstraria que a situação está “abrangida pela ordem de suspensão das reintegrações de posse coletivas vigente até 31/10/2022 e, por isso mesmo, submetida às condições fixadas por este Supremo Tribunal para a retomada dos processos de desocupação”