A Sexta Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) rejeitou, por unanimidade, o recurso apresentado pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e ratificou a sentença que estipula o pagamento de R$ 10 milhões em danos morais ao povo indígena Terena, no Mato Grosso. Além disso, determina o fornecimento dos recursos necessários para a aquisição de terras destinadas à comunidade.
O histórico de décadas de privações, carência, insegurança, deslocamentos forçados e a notável morosidade das autoridades públicas têm sido os desafios enfrentados pelos Terena. A comunidade aguarda há duas décadas a resolução de uma ação civil pública, que está paralisada desde 2017 devido a um recurso da Funai.
O Ministério Público Federal (MPF) tem acompanhado o caso desde 1999, quando iniciou um procedimento administrativo para facilitar a negociação entre as partes e buscar uma resolução extrajudicial. Diante da falta de sucesso, o MPF moveu uma ação civil pública em 2002, considerando a situação dos Terena como “inconcebível e aviltante”. A Funai foi então condenada a pagar danos morais, além de ser obrigada a regularizar uma área de 52 mil hectares no sul do estado para destinar ao povo indígena.
A Funai recorreu da sentença questionando o valor de R$ 10 milhões perante o TRF1. O MPF, ao ser consultado, destacou o evidente dano moral sofrido pela comunidade indígena, que teve sua honra e dignidade como grupo étnico violadas. Ademais, considera adequado o valor fixado pelo tribunal, argumentando que além de compensatório, o montante tem uma função punitiva para desencorajar condutas semelhantes no futuro.
Durante anos, a Funai negligenciou as demandas dos Terena, alegando que suas terras tradicionais estavam no Mato Grosso do Sul. No entanto, a reserva destinada a eles nesse estado é insuficiente para abrigar toda a população, resultando em condições precárias de vida e limitando suas práticas agrícolas.
Para o MPF, é obrigação da Funai garantir o direito constitucional do povo indígena à terra, fundamental para sua existência física e cultural. O órgão ressalta que esse direito não depende da ocupação ancestral do território, uma vez que essa possibilidade foi retirada dos Terena há muito tempo devido a diversos tipos de violência e humilhação, inclusive perpetrados pela Funai.
Com a rejeição do recurso pelo TRF1, os termos da sentença de primeira instância voltam a vigorar. A Funai deve regularizar a área designada como Gleba Jarinã para ser destinada aos Terena. Essa área deverá ser anexada à Gleba Iriri, onde a comunidade atualmente reside, para atender adequadamente às necessidades da etnia, cujo estilo de vida, baseado na agricultura, requer extensões de terra suficientes. Se não for possível completar toda a área, a sentença prevê a possibilidade de indenização aos indígenas com valores correspondentes aos praticados no mercado.
A história dos Terena é marcada por séculos de deslocamentos forçados e expropriação territorial. Segundo um laudo antropológico, a comunidade tem vagado por diversas regiões do centro-oeste brasileiro, fugindo da expansão agropecuária e de outras invasões de não-indígenas em suas terras.
Na sessão de julgamento realizada em 24 de abril, o procurador regional da República Felício Pontes Júnior destacou que os Terena receberam a promessa de demarcação de suas terras pelo Estado brasileiro durante a Guerra do Paraguai (1864-1870), porém até hoje, poucas de suas terras foram efetivamente demarcadas.