Em uma decisão histórica, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) invalidou o interrogatório de dois indivíduos acusados que buscavam responder apenas às questões propostas por seu advogado, mas tiveram sua solicitação rejeitada pelo magistrado. A decisão, tomada em uma sessão virtual concluída em 12 de abril, reforça que o direito constitucional ao silêncio é uma ferramenta de defesa e pode ser exercido pelo réu da maneira que achar mais adequada.
No processo em questão, um casal foi acusado de tráfico de drogas por guardar em sua residência 54,6 gramas de maconha. De acordo com a acusação, a propriedade, localizada no município de Salete (SC), era usada para armazenar e comercializar drogas para usuários da região. Após a solicitação para responder exclusivamente às perguntas de sua defesa, o magistrado encerrou a audiência de instrução, argumentando que o direito ao silêncio não pode ser exercido de forma parcial.
As solicitações para anular o interrogatório foram negadas tanto pelo Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina (TJ-SC) quanto pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). No Recurso Ordinário em Habeas Corpus (RHC) 213849 ao STF, a defesa alegou constrangimento ilegal e violação do direito ao silêncio.
O relator, ministro Ricardo Lewandowski (aposentado), também negou a solicitação e reafirmou essa posição no julgamento do recurso (agravo regimental) contra sua decisão, iniciado em sessão virtual de abril de 2022. Após os votos dos ministros Edson Fachin e André Mendonça, a análise foi interrompida por um pedido de vista do ministro Gilmar Mendes.
O ministro Fachin, primeiro a divergir do relator, observou que o exercício do direito ao silêncio não implica que o acusado estaria admitindo culpa. Ele enfatizou que o direito constitucional à não autoincriminação deve ser exercido pelo acusado da maneira que achar mais adequada, uma vez que deve ser compatível com sua condição de instrumento de defesa e meio de prova.
Ele destacou que o Código de Processo Penal (artigo 186) não impõe qualquer restrição à promoção da ampla defesa durante o interrogatório. Por essa razão, segundo Fachin, “a seleção das perguntas que serão respondidas e aquelas que serão silenciadas, harmoniza o exercício da defesa com o direito à não incriminação”.
Por sua vez, o ministro Gilmar Mendes ressaltou que o interrogatório é um direito do acusado, e não uma obrigação. Nesse sentido, considerou que a conclusão de que o réu só teria direito ao silêncio se o exercer em sua totalidade não é compatível com a jurisprudência do STF. “Portanto, o acusado tem o direito de responder a todas, algumas ou nenhuma pergunta, o que inclui, naturalmente, o direito de escolher quem as formulará”, afirmou.
Os ministros André Mendonça e Nunes Marques também votaram pela anulação do interrogatório. O ministro Dias Toffoli não participou do julgamento por ser o sucessor do ministro Lewandowski na Turma.