O ministro Gilmar Mendes, integrante do Supremo Tribunal Federal (STF), ordenou a paralisação, em âmbito nacional, dos processos judiciais que questionam a constitucionalidade da Lei do Marco Temporal (Lei 14.701/2023) até que o Tribunal se pronuncie definitivamente sobre a questão.
O ministro justificou a medida como uma forma de prevenir o aparecimento de decisões judiciais divergentes que possam acarretar sérios danos às partes envolvidas (comunidades indígenas, entidades federativas ou indivíduos).
Concomitantemente, o ministro Gilmar Mendes iniciou o processo de mediação e conciliação no contexto do STF, com o objetivo de encontrar uma resolução para o reconhecimento, demarcação, uso e gestão de terras indígenas.
A medida cautelar foi concedida pelo relator nos autos da Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 87, das Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) 7582, 7583 e 7586 e da Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) 86, onde partidos políticos e entidades da sociedade civil contestam a Lei do Marco Temporal.
Insegurança jurídica acentuada Na decisão, o relator identificou a existência de um conflito aparente entre possíveis interpretações da Lei 14.701/2023 e os parâmetros estabelecidos pelo STF no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 1017365, o que poderia resultar em uma situação de insegurança jurídica acentuada. Naquele julgamento, a Corte rejeitou a tese do marco temporal para a demarcação de terras indígenas, ao eliminar o requisito relativo à necessidade de ocupação ou disputa da área na data de promulgação da Constituição Federal (5/10/1988).
Além do aspecto da segurança jurídica, o ministro enfatizou a necessidade de que o conflito social relacionado ao tema seja efetivamente resolvido.
Métodos de autocomposição Foi neste contexto que o ministro Gilmar Mendes decidiu buscar o processo de conciliação e mediação. Segundo ele, “os métodos de autocomposição não podem mais ser considerados alternativos”, impondo-se a convocação dos atores constitucionais para uma “mudança de cultura do litígio constitucional”, especialmente em relação a conflitos que envolvem debates político-jurídicos de grande relevância.
Ele determinou a formação de uma comissão especial, que deverá apresentar propostas de soluções para o impasse político-jurídico e para o aprimoramento da Lei 14.701/2023. A decisão estabelece um prazo de 30 dias para que os autores das ações, os chefes dos Poderes Executivo e Legislativo, a Advocacia-Geral da União e a Procuradoria-Geral da República apresentem propostas como primeiro passo do procedimento conciliatório.
Compreenda o caso Em setembro do ano passado, o STF concluiu a avaliação do marco temporal e estabeleceu, entre outras teses, que “a proteção constitucional aos direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam independe da existência de um marco temporal em 05 de outubro de 1988 ou da configuração do renitente esbulho, como conflito físico ou controvérsia judicial persistente à data da promulgação da Constituição”.
No entanto, antes da publicação da decisão do STF, o Congresso Nacional promulgou a Lei 14.701/2023, regulamentando diversos aspectos do artigo 231 da Constituição Federal, e restabeleceu o marco temporal para incidir apenas sobre as terras tradicionalmente ocupadas pelos indígenas brasileiros e por eles habitadas em 5/10/1988, salvo as hipóteses de persistente conflito devidamente comprovado.
A lei teve vários de seus dispositivos vetados pelo presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, mas o veto foi derrubado pelo Congresso Nacional, com promulgação das partes vetadas. Diante deste cenário, diversos partidos políticos e entidades de defesa dos direitos dos povos indígenas acionaram o Supremo.