Na sessão de quinta-feira, 6 de junho, o colegiado do Supremo Tribunal Federal (STF), por maioria, concluiu que o Recurso Extraordinário (RE) 845779, que trata de uma mulher transgênero proibida de utilizar o sanitário feminino em um centro comercial de Florianópolis (SC), não aborda questões constitucionais e, portanto, não deve ser apreciado pelo tribunal. Isso implica que o plenário não discutiu o direito das pessoas transgênero de serem socialmente reconhecidas de acordo com sua identidade de gênero, o que poderá ser objeto de outro processo no futuro.
Inicialmente, o centro comercial foi condenado a pagar uma indenização de R$ 15 mil à mulher, mas o Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJ-SC) reformou a sentença, entendendo que não houve dano moral, mas apenas um “mero dissabor”. A mulher, então, recorreu ao STF.
Em 2014, o plenário havia reconhecido a repercussão geral do recurso, interpretando que a questão em discussão era o direito das pessoas transgênero de serem socialmente reconhecidas de acordo com sua identidade de gênero, inclusive no uso de banheiros públicos. No entanto, no julgamento de hoje, a maioria do plenário concluiu que esse aspecto não foi abordado na decisão do TJ-SC, que se limitou à análise da ocorrência de danos morais. Portanto, o caso específico não era adequado para a discussão da questão constitucional. Assim, o STF revogou o reconhecimento da repercussão geral do tema (quando a decisão se aplica a casos semelhantes).
O julgamento do mérito começou em 2015, com os votos do relator e atual presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso, e do ministro Edson Fachin. Ambos foram favoráveis ao recurso para estabelecer que esse grupo social tem o direito de ser tratado de acordo com sua identidade de gênero. Hoje, a ministra Cármen Lúcia acompanhou esse entendimento.
No voto-vista que prevaleceu no julgamento, o ministro Luiz Fux destacou que o tribunal estadual, ao negar a indenização, concluiu que não houve evidências de abordagem rude, agressiva ou motivada por preconceito ou transfobia. Segundo Fux, o STF não pode analisar uma questão que não foi abordada na decisão objeto do recurso.
Da mesma forma, o ministro Flávio Dino observou que a sentença questionada foi fundamentada exclusivamente no Código de Defesa do Consumidor, uma legislação infraconstitucional. Votaram no mesmo sentido os ministros Cristiano Zanin, André Mendonça, Nunes Marques, Alexandre de Moraes, Dias Toffoli e Gilmar Mendes.
A questão específica do direito das pessoas transgênero de utilizarem banheiros e outros espaços de acordo com sua identidade de gênero, sem discriminação, foi recentemente levada ao Supremo em cinco Arguições de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPFs 1169, 1170, 1171, 1172 e 1173).