Um estudo inédito realizado pela Faculdade Baiana de Direito, em colaboração com o portal jurídico Jus Brasil e o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), analisou 107 acórdãos judiciais (decisões colegiadas) de segunda instância no Brasil, abrangendo o período de julho de 2010 a outubro de 2022. A pesquisa se concentrou em ações penais, cíveis e trabalhistas relacionadas a casos de racismo e injúria racial ocorridos em redes sociais. O estudo revelou que as mulheres representaram a maioria esmagadora das vítimas, concentrando 60% dos casos.
De acordo com os resultados da pesquisa, apenas 18,29% dos casos envolviam homens como vítimas, enquanto em 23,17% das ações não foi possível identificar o gênero das vítimas, uma vez que esses casos envolviam episódios de racismo direcionados a grupos inteiros, sem distinção de gênero. Os tipos mais comuns de ofensas relatadas incluíam xingamentos, nomes pejorativos e a prática de animalização, direcionados tanto a homens quanto a mulheres.
A pesquisa também ressaltou que, em relação aos autores dos crimes, 55,56% eram do gênero masculino, 40,74% do gênero feminino, e 3,7% não tiveram o gênero identificado. Esse último dado destacou que a presença de mulheres entre os agressores é mais expressiva do que o observado em pesquisas relacionadas a outros tipos de criminalidade.
No que se refere às condenações, o estudo identificou um total de 82 apelações (recursos à segunda instância) nos tribunais de Justiça e tribunais regionais federais. A maioria dessas apelações (61) era de natureza penal, e dentre elas, 51 resultaram em condenações dos agressores, representando uma taxa de 83,6% de condenações. As penas aplicadas variaram, com uma maior frequência de penas privativas de liberdade para os condenados por injúria racial (25%) em comparação àqueles condenados por discriminação racial (11,11%).
A pesquisa catalogou três principais tipos de provas utilizadas nos casos de condenação por racismo e injúria racial nas redes sociais. Os prints, capturas de tela com caráter de prova documental, foram as provas mais frequentemente mencionadas nos acórdãos (44), seguidas pelos boletins de ocorrência (26) e depoimentos de testemunhas (17).
É importante observar que, de todas as condenações, nenhum réu foi sentenciado a cumprir pena em regime fechado. De 54 condenações analisadas, 49 resultaram em regime aberto, três em regime semiaberto, e em duas não houve informações disponíveis. A pena média para o crime de injúria racial foi de 16,4 meses, ligeiramente superior à pena mínima. Esse dado revela uma tendência da cultura judicial de aplicar a pena mínima no Brasil em casos de crimes raciais.
O relatório também destaca avanços, embora modestos, nas ações judiciais relacionadas a casos de racismo e injúria racial na internet nos últimos anos. No entanto, os autores do estudo enfatizam a necessidade de melhorias, citando preocupações com a falta de clareza na definição das condutas discriminatórias e a ausência de sanções em alguns casos. O relatório foi divulgado no seminário “Desafios do Racismo nas Redes,” promovido pelo Ministério da Igualdade Racial e pelo PNUD, com o objetivo de contribuir para o combate ao racismo nas redes sociais no Brasil. A pesquisa busca fornecer informações relevantes para que instituições e a sociedade civil atuem de maneira mais eficaz no enfrentamento desse fenômeno.
Fonte: Alepi.