A Subseção II Especializada em Dissídios Coletivos (SDC) do Tribunal Superior do Trabalho (TST) restabeleceu, por maioria de votos, a cláusula de acordo coletivo que autoriza a Souza Cruz Ltda., situada em Santa Cruz do Sul/RS, a adotar o registro de controle de jornada por exceção. Nessa modalidade, a jornada contratual pré-fixada prevalece na ausência de apontamentos de “exceção”. O colegiado seguiu a orientação do Supremo Tribunal Federal (STF), concluindo que a matéria não envolve direitos indisponíveis e pode ser objeto de negociação por meio de acordo coletivo.
O acordo coletivo de trabalho 2014/2015 foi celebrado entre a Souza Cruz e o Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias do Fumo e Alimentação de Santa Cruz do Sul e região. A cláusula 29 estabelecia a adoção do sistema alternativo de controle de jornada, no qual apenas as exceções ocorridas durante a jornada normal de trabalho são registradas.
Conforme o texto, o sistema não impõe restrições ou exigências de autorização para os apontamentos, permitindo que os empregados acessem, a qualquer momento, para realizar, excluir ou alterar registros, bem como consultar informações. A empresa emite mensalmente um relatório individual para conferência.
O Ministério Público do Trabalho (MPT), ao ajuizar a ação anulatória em 2015, argumentou que o sistema alternativo contrariava o parágrafo 2º do art. 74 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que, na redação então vigente, exigia o registro de entrada e saída para empresas com mais de 10 empregados.
Segundo o MPT, o registro por exceção não viabiliza o controle efetivo e seguro do horário, resultando na presunção do cumprimento normal e regular da jornada de trabalho, o que nem sempre reflete a realidade.
O Tribunal Regional do Trabalho da 4ª região anulou a cláusula, decisão inicialmente confirmada pela SDC. Em resposta, a Souza Cruz apresentou recurso extraordinário ao STF, cuja tramitação foi suspensa até a definição de tese de repercussão geral sobre a validade de norma coletiva de trabalho que limita ou restringe direitos trabalhistas não assegurados constitucionalmente (Tema 1.046).
No julgamento, o STF estabeleceu a tese vinculante de que são constitucionais os acordos e as convenções coletivas que restrinjam ou afastem direitos trabalhistas, desde que respeitados os direitos absolutamente indisponíveis. Com isso, o processo retornou à SDC para reexame do caso visando eventual modificação da decisão anterior, o chamado juízo de retratação.
Ao propor a reforma do entendimento, a relatora, ministra Maria Cristina Peduzzi, avaliou que a norma coletiva não prejudicou direitos trabalhistas absolutamente indisponíveis. Ela citou precedente em que a própria SDC, em caso similar, concluiu que o sindicato e a empresa podem, por meio de negociação coletiva, acordar sobre a forma como o controle de frequência será exercido, desde que não viole a lei.
Análise
A advogada da Souza Cruz, Vanessa Dumont, sócia do Caputo, Bastos e Serra Advogados, destaca que “a decisão, além de reforçar o papel constitucional das convenções e acordos coletivos de trabalho como importantes instrumentos de pacificação social, também evidencia a autonomia de trabalhadores e empregadores no regime democrático de direito. A validação da norma coletiva, livremente pactuada, reflete a vontade soberana de todos os envolvidos no processo deliberativo laboral. O método de registro de ponto é direito disponível do trabalhador, passível de negociação, conforme entendimento já pacificado pelo Supremo, ao apreciar o Tema 1046 de sua tabela de repercussão geral.”
Fonte: Migalhas.