O Supremo Tribunal Federal (STF) está atualmente em processo de julgamento, no âmbito de plenário virtual, de uma ação proposta pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) contra decisões proferidas pela Justiça do Trabalho. As referidas decisões, no contexto de condenações por danos morais coletivos em ações civis públicas, alegadamente desviaram os valores arrecadados para destinações que não estariam em conformidade com a legislação pertinente.
A maioria dos votos até o momento propende para o acolhimento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF), em consonância com o voto divergente apresentado pelo ministro André Mendonça.
O término do julgamento está agendado para a segunda-feira, 7 de novembro. A CNI sustenta que, de acordo com o artigo 13 da Lei da Ação Civil Pública (Lei nº 7.347/85), a indenização resultante de danos causados deve ser encaminhada a um fundo administrado por um órgão federal ou estadual, que envolve a participação obrigatória do Ministério Público e de representantes da comunidade. Além disso, conforme estabelecido pela norma, os recursos devem ser aplicados na reparação dos danos causados.
Entretanto, a CNI alega que os magistrados trabalhistas têm destinado esses recursos a entidades privadas, doações a entidades públicas ou privadas ou ao atendimento de interesses institucionais do Ministério Público do Trabalho. A confederação sustenta que as condenações devem, de forma mandatória, ser direcionadas ao Fundo de Defesa de Direitos Difusos (FDDD), cujo comitê gestor determinaria sua aplicação.
No âmbito da ação, a entidade também menciona decisões dos Tribunais do Trabalho que, com base na interpretação da Lei da Ação Civil Pública, consideram a possibilidade de destinar esses recursos ao Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). Consoante à mesma lógica presente na referida norma, uma vez aportados no FAT, a utilização desses recursos seria definida pelo comitê gestor correspondente, ou seja, o Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador (Codefat).
A CNI argumenta que tais decisões desrespeitam diversos princípios, incluindo a separação dos poderes, a legalidade orçamentária e a proibição de criar fundos sem autorização legislativa prévia. Portanto, a confederação solicita a suspensão dos efeitos de todas as decisões judiciais que contrariam a Lei da Ação Civil Pública e ainda não possuem decisão final.
Destino dos recursos questionado
Em 2018, uma reportagem da Migalhas levantou a questão do destino dos recursos arrecadados pelo Ministério Público do Trabalho (MPT). Naquela ocasião, Márcio Amazonas, procurador do MPT, esclareceu que não existia uma regulamentação rígida sobre o destino dessas verbas. Isso se devia ao fato de a Lei das Ações Civis Públicas estipular, em seu artigo 13, que “havendo condenação em dinheiro, a indenização pelo dano causado reverterá a um fundo gerido por um Conselho Federal”.
Em decorrência dessa lacuna normativa, o procurador observou que o MPT e a Justiça do Trabalho precisaram criar soluções criativas para determinar a destinação desses recursos. Ele mencionou possíveis destinos, tais como instituições sociais, órgãos públicos, fundos estaduais de amparo ao trabalhador e o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT).
O procurador afirmou que o Ministério Público não emitiu regulamentações específicas sobre o assunto, visto que tal iniciativa invadiria a competência legislativa de outro órgão.
Não conhecimento da ação
A ministra aposentada Rosa Weber, relatora do processo, emitiu voto no sentido de não conhecer da ação e extinguir o processo sem apreciação do mérito. A ministra argumentou que, por questões processuais, a CNI não possuiria legitimidade ativa para propor a ADPF.
Além disso, a relatora esclareceu que a entidade estaria, na realidade, buscando contestar a legalidade de decisões judiciais, o que não seria cabível em ações de controle concentrado de constitucionalidade.
“Em resumo, a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental não se presta a defender direitos e interesses individuais e concretos, nem serve como recurso indireto. O acesso direto a este Supremo Tribunal, por essa via, é inviável.”
Os ministros Edson Fachin e Cristiano Zanin concordaram com a relatora.
Conhecimento da ação
Por outro lado, em um voto divergente, o ministro André Mendonça argumentou que o caso não se trata da proteção de situações específicas, mas, aparentemente, de uma prática comum no âmbito do Poder Judiciário trabalhista.
“Nesse contexto, com a devida deferência às opiniões em contrário, considero que não se trata apenas de uma alegação de violação reflexa da Constituição, que demandaria apenas um exame de legalidade, uma vez que está em jogo a compatibilidade direta das decisões impugnadas com os artigos 2º, 60, § 4º, inciso III e 167, incisos I e XIV, da Constituição da República.”
Os ministros Luís Roberto Barroso, Dias Toffoli, Gilmar Mendes, Luiz Fux e Alexandre de Moraes acompanharam a divergência.
Fonte: Migalhas.