O Ministério Público Federal (MPF) encaminhou um comunicado oficial ao prefeito de Belo Horizonte, Fuad Jorge Noman Filho, no qual expressou sua recomendação de veto ao Projeto de Lei (PL) nº 545/2023, aprovado pela Câmara Municipal no mês anterior. Caso o referido projeto seja sancionado, estabelecerá um período de cinco anos como limite para a continuação da circulação de carroças puxadas por animais na capital mineira.
O dispositivo proposto fixa o dia 22 de janeiro de 2026 como data derradeira para a utilização de veículos de tração animal, alterando, assim, os termos da Lei Municipal nº 11.285/2021, que inicialmente estipulava um prazo de dez anos para a proibição definitiva das carroças. O MPF argumenta que tanto o Projeto de Lei quanto a legislação vigente desrespeitam os direitos étnico-territoriais da comunidade cigana Calon e dos carroceiros que exercem atividades econômicas em Belo Horizonte. Tal desrespeito ocorreu devido à aprovação dessas medidas sem a devida realização de consulta prévia, livre, informada e de boa-fé, conforme previsto na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
No documento encaminhado à Prefeitura, o MPF informa que iniciou um inquérito civil com o propósito de investigar a responsabilidade do município na violação dos direitos da comunidade tradicional. Além disso, o MPF aderiu à recomendação emitida pela Defensoria Pública do Estado de Minas Gerais (DPMG) e apoia integralmente as preocupações destacadas, particularmente em relação aos vícios de inconstitucionalidade formal e material que afetam o Projeto de Lei 545/2023.
Segundo o MPF, a rejeição integral do Projeto de Lei e a adoção de outras medidas corretivas são essenciais para evitar que as leis municipais perpetuem a violação dos direitos. Tais medidas servem como uma forma de controle político, preventivo e repressivo, visando garantir a constitucionalidade e prevenir prejuízos financeiros ao erário público. O procurador da República Helder Magno adverte que tanto o Município quanto a União podem ser responsabilizados judicialmente por eventuais danos materiais e morais decorrentes da obstrução dos modos de vida, produção e sustento dos carroceiros, que já foram reconhecidos como uma comunidade tradicional pela Comissão Estadual de Povos e Comunidades Tradicionais de Minas Gerais.
Inconstitucionalidades e racismo ambiental – Entre os vícios de inconstitucionalidade formal que afetam o PL 545/2023 e a Lei Municipal 11.285/2021, incluem a violação das competências legislativas da União e a transgressão do princípio da separação dos poderes.
Além disso, a inconstitucionalidade material é evidente na violação dos direitos e garantias fundamentais, como o direito à proteção do patrimônio histórico e cultural, além da violação dos princípios de liberdade de locomoção, livre iniciativa e exercício do trabalho. De acordo com a recomendação da DPMG, as disposições municipais também perpetuam o racismo ambiental contra a comunidade carroceira, uma vez que o trabalho humano e animal com as carroças não implica maus-tratos. Belo Horizonte possui a Lei Municipal 10.119/2011, que regula a circulação de veículos de tração animal e animais, estabelecendo normas para garantir a saúde e o bem-estar dos seres vivos não humanos.
Por fim, a recomendação sustenta que muitas pessoas dependem dos veículos de tração animal para exercer atividades econômicas. Portanto, a proibição do uso de carroças impacta negativamente em atividades produtivas e trabalhos dignos, nos quais inúmeras famílias baseiam sua subsistência.
Fonte: MPF.