A ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF), solicitou a suspensão do julgamento virtual referente à isenção de impostos sobre agrotóxicos no território brasileiro. O ministro Edson Fachin, que atuou como relator, emitiu um voto determinando a inconstitucionalidade da referida redução e isenção. A divergência foi inaugurada pelo ministro Gilmar Mendes, com apoio de Cristiano Zanin e Dias Toffoli, enquanto André Mendonça propôs uma posição intermediária.
Contexto do Caso
O Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) moveu uma ação contra duas cláusulas do convênio 100/97 do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), juntamente com dispositivos da tabela de incidência do imposto sobre produtos industrializados, estabelecida pelo Decreto 7.660/11, que foi posteriormente revogado pelo Decreto 8.950/16.
A primeira cláusula questionada reduz em 60% a base de cálculo do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) incidente sobre agrotóxicos em transações interestaduais. A segunda cláusula permite que os Estados e o Distrito Federal concedam a mesma redução nas operações internas envolvendo agrotóxicos. Além disso, o decreto concede isenção completa de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para agrotóxicos.
O PSOL alega que a isenção fiscal para agrotóxicos viola diretamente normas constitucionais, sendo incompatível com os direitos fundamentais ao meio ambiente equilibrado e à saúde, bem como com o princípio da seletividade tributária, uma vez que tais substâncias representam uma “essencialidade às avessas”, contrariando o interesse público.
Posição do Relator
O ministro Edson Fachin julgou a ação procedente, invalidando os dispositivos que estabelecem a redução e a isenção tributárias para agrotóxicos. O relator ressaltou que o uso indiscriminado dessas substâncias pode acarretar danos ao meio ambiente, expondo seres humanos à poluição do ar e da água, colocando em risco a saúde. Fachin argumentou que a questão pode ser considerada um problema de saúde pública, uma vez que os agrotóxicos presentes nos alimentos podem comprometer o direito à alimentação saudável. Citando dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) sobre envenenamento por agrotóxicos, Fachin concluiu que o Sistema Único de Saúde (SUS) acaba sendo impactado, resultando em maiores custos para o Estado. O ministro também enfatizou que os trabalhadores que lidam com essas substâncias sofrem impactos negativos, ressaltando a necessidade de precaução por parte do poder público, considerando que o uso de agrotóxicos acarreta riscos à saúde humana e ao equilíbrio da fauna e da flora.
Fachin argumentou que qualquer incentivo deve ser direcionado a práticas consideradas menos prejudiciais ao meio ambiente, à fauna, à flora e à sociedade como um todo.
Divergência
O ministro Gilmar Mendes inaugurou a divergência, propondo a improcedência total da ação. Ele argumentou que a concessão dos benefícios fiscais questionados não viola o direito à saúde ou ao meio ambiente equilibrado. Gilmar Mendes justificou sua posição, alegando que a potencial lesividade de um produto não elimina sua essencialidade, como no caso de medicamentos. Além disso, ele afirmou que existem regulamentos rigorosos para avaliação toxicológica, ambiental e agronômica na autorização de defensivos agrícolas, garantindo que seus efeitos negativos sejam minimizados em relação aos benefícios de seu uso. O ministro também ressaltou que o estágio atual de desenvolvimento técnico-científico não permite a eliminação completa dos agrotóxicos em um país de dimensões continentais como o Brasil.
Gilmar Mendes argumentou que os benefícios fiscais devem ser analisados em relação às consequências que geram, como a redução dos preços dos alimentos, sem que seja necessário fazer uma escolha entre alimentos orgânicos e não orgânicos, mas sim atender ao objetivo fundamental da República Federativa do Brasil de erradicar a fome.
Posição de André Mendonça
André Mendonça votou pela parcial procedência da ação, afirmando a existência de um processo de inconstitucionalização das desonerações fiscais federais e estaduais sobre agrotóxicos. Ele estabeleceu um prazo de 90 dias para que o poder Executivo da União e dos Estados realize uma avaliação adequada e atualize a carga tributária dos agrotóxicos permitidos no país.
André Mendonça determinou que os agentes públicos considerem e fundamentem suas conclusões sobre variáveis como a conveniência da manutenção, extinção ou modificação do modelo isentivo atual, bem como os impactos do progresso tecnológico e a ponderação de variáveis ambientais e o grau de toxicidade dos agrotóxicos na graduação da carga tributária, caso a política fiscal prossiga, mesmo que sob uma nova forma.
Fonte: Migalhas.