A família residente em Natal foi sentenciada a indenizar uma empregada doméstica em R$ 110 mil devido a condições laborais que configuraram violação à dignidade humana, conforme decisão judicial publicada em 14 de março.
A empregada iniciou seus serviços em 1982 como lavadeira para a família, evoluindo para diarista, realizando serviços de limpeza na residência e na academia da família, situadas em edifícios adjacentes. A partir de 1989, sua ocupação tornou-se permanente e, posteriormente, assumiu responsabilidades adicionais, incluindo cuidar da casa da mãe e de uma das filhas da família, que residiam em imóvel próximo. Ela passou a habitar um quarto construído no terreno da família, com o aluguel deduzido de seu salário.
A empregada acompanhava viagens da família, atendendo às necessidades das crianças, e era obrigada a trabalhar durante as férias na casa de veraneio. Em um incidente, enquanto engomava roupas na casa de uma das filhas da família, a empregada sofreu um acidente vascular cerebral (AVC), sendo posteriormente diagnosticada e medicada.
Após dois anos trabalhando para um parente da família em Recife, a empregada retornou a Natal. Em 2022, afastou-se do emprego devido a conflitos com o cônjuge de uma das filhas e para tratar de problemas de saúde mental. Ao tentar se aposentar pelo INSS, descobriu a falta de tempo de contribuição previdenciária, levando-a a buscar reparação judicial.
Os pedidos da empregada incluíam o reconhecimento do vínculo empregatício, anotação na carteira de trabalho, pagamento de diferenças salariais e indenização por danos extrapatrimoniais decorrentes da doença adquirida no ambiente de trabalho.
A família argumentou que a empregada atuava como diarista, não como doméstica, e que nunca houve solicitação de formalização do vínculo por parte dela.
A juíza Lygia Maria Godoy, da 9ª Vara do Trabalho de Natal, rejeitou a defesa da família, concluindo que a empregada foi submetida a condições de trabalho semelhantes à escravidão, resultando em danos à sua saúde mental. Decidiu, assim, pela rescisão indireta do contrato de trabalho da empregada e determinou que a família anotasse retroativamente sua carteira de trabalho, além de pagar diversas verbas rescisórias e indenizatórias.
A magistrada também considerou que a negligência da família em cumprir direitos trabalhistas, como a anotação na carteira de trabalho e os recolhimentos previdenciários, ao longo de mais de 40 anos, caracterizava trabalho análogo à escravidão. Consequentemente, condenou solidariamente a mãe e a filha da família a indenizarem a empregada em R$ 110 mil por danos extrapatrimoniais e pela doença psicológica adquirida no ambiente de trabalho. A decisão foi de primeira instância e ainda cabe recurso.