Nota | Civil

Reforma do Código Civil reforça autonomia dos cônjuges e altera regras patrimoniais e familiares

Entre as mudanças celebradas está a possibilidade de alteração extrajudicial do regime de bens, sem necessidade de intervenção do Ministério Público ou homologação judicial.

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A proposta de reforma do Código Civil, apresentada em abril de 2024 por comissão de juristas do Senado, tem como um dos pilares o fortalecimento da autonomia privada no Direito de Família, especialmente quanto ao regime de bens no casamento. No terceiro encontro da série “Reforma do Código Civil em Foco”, realizado na FGV-Rio na última sexta-feira (11/04), especialistas elogiaram as inovações propostas e destacaram avanços significativos na legislação.

Entre as mudanças celebradas está a possibilidade de alteração extrajudicial do regime de bens, sem necessidade de intervenção do Ministério Público ou homologação judicial. Para Maria Berenice Dias, desembargadora aposentada e integrante da subcomissão de Direito de Família, essa mudança reconhece a maturidade dos cônjuges e elimina exigências desproporcionais — sobretudo quando, na união estável, tais alterações já ocorrem com maior flexibilidade.

A proposta também cria o regime híbrido de bens, permitindo, por exemplo, que o casal opte por separação total nos primeiros anos e, futuramente, passe à comunhão parcial. Outra inovação é o fim da separação obrigatória de bens para maiores de 70 anos, que, segundo Dias, representa “um intervencionismo estatal injustificável” que nega direitos patrimoniais a relações legítimas.

A reforma ainda propõe avanços no reconhecimento da coparentalidade e na responsabilização de genitores ausentes. Dias defendeu que mães solo devem ser indenizadas pelo abandono parental, denunciando o desequilíbrio na divisão de cuidados. Já o professor Rolf Madaleno, da PUC-RS, ressaltou a urgência de reconhecer a separação de fato como marco jurídico do fim do casamento, substituindo a dependência de divórcio formal para cessar efeitos patrimoniais.

Madaleno também destacou a ampliação da possibilidade de pactos pré e pós-nupciais, incluindo cláusulas existenciais como pensão e guarda em caso de separação. “Hoje se casa não com o olhar da eternidade, mas com a consciência da ruptura possível”, afirmou, ao defender maior liberdade contratual no âmbito familiar.

Outro ponto abordado foi a paternidade presumida, com proposta de registro direto pela mãe e posterior notificação ao suposto pai, invertendo o modelo atual e simplificando processos. Por fim, Madaleno elogiou o aperfeiçoamento da filiação socioafetiva, que passará a exigir reconhecimento judicial, coibindo abusos em pedidos de alimentos ou herança por vínculos afetivos que não refletem relações parentais efetivas.

A coordenação dos encontros da FGV Justiça está sob responsabilidade do ministro Luis Felipe Salomão, do STJ, presidente da comissão de juristas encarregada da reforma. O debate aponta para um novo paradigma do Direito Civil: mais moderno, humanizado e centrado na liberdade das relações afetivas.